sexta-feira, 30 de novembro de 2012

PESSOAS INVISÍVEIS

Há milhares delas. São homens e mulheres que, por diversos motivos, deixam para trás a casa, o emprego, a família e vão viver nas ruas da cidade


Eles estão espalhados pelas praças da cidade de São Paulo. Dormem pelas calçadas. Modificam as paisagens. Estão expostos aos mais variados tipos de violência. Sofrem com o frio, o sol, a chuva. Aos olhos da sociedade, das pessoas que passam apressadas em direção a seus trabalhos, são invisíveis. Eles são os moradores de rua. “De rua não, de calçada. Na rua o carro pega a gente”, diz, com um sorriso desdentado, um morador de rua ao lado de dois amigos nas mesmas condições - vivem amontoados pela Praça da Sé. Ele não quis se identificar. 

O parágrafo único do Decreto Federal nº 7.053/09 conceituou a população em situação de rua: “grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória”.

São princípios do Decreto: “respeito à dignidade da pessoa humana; direito à convivência familiar e comunitária; valorização e respeito à vida e à cidadania; atendimento humanizado e universalizado; respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual e religiosa, com atenção especial às pessoas com deficiência.”

Na prática esses princípios ainda não funcionam. De acordo com uma pesquisa sobre a “População em situação de rua”, realizada pela Fundação Instituto de Pesquisa Econômica (FIPE), em 2009, o município de São Paulo está entre os mais preconceituosos do País. Na visão dos entrevistados a solução para sanar tais problemas seria retirá-los das ruas e colocá-los em instituições. Além disso em relação à violência, a pesquisa apurou também que os moradores de rua na cidade estão entre os que sofrem maior violência; seja devido a drogas, seja por parte dos órgãos responsáveis pela segurança pública dos governos estadual e municipal ou violência física dentro do próprio grupo.

>>ALEMÃO

“Tem muita gente que tira muitos anos numa cadeia, preso porque roubou um pacote de arroz. Eu não nasci para isso, ao menos, a minha grana eu ganho, é limpo.” Quem afirma é Antônio Hercolino Lima, 52, o Alemão, como é conhecido no bairro Paraíso, onde vive há 12 anos. Alemão mora na rua, mas tem trabalho. É carroceiro. Ele passa o dia recolhendo lixo reciclável para vender em outro bairro, no Glicério. Puxa todos os dias, por oito quilômetros, sua carroça abarrotada de recicláveis; quatro de ida e quatro de volta. Alemão diz que aquele trabalho foi o único que encontrou. Estava na rua. Precisava de um meio para sobreviver. O trabalho de Alemão não é fácil e ele ainda tem que ouvir pessoas fazendo piadas sobre sua condição. “Tem gente que ofende. Diz nunca ter visto um burro de dois pés puxando uma carroça, mas eu tiro de letra”, conta resignado. Quando o assunto é a família, Alemão muda a postura. Desvia os olhos vermelhos e inchados - por conta do alcoolismo. “Praticamente eu optei por me separar um pouco da família, mas eu tenho contato com eles”, assegura e, sem querer prolongar a conversa, fica em silêncio. Alemão é um entre os milhares de moradores que, solitários ou em grupos, habitam as calçadas da cidade.Em 2011, a Prefeitura de São Paulo realizou o Censo da População em situação de rua. O levantamento demonstrou que, do total de 14.478 pessoas, 6.765 vivem nas ruas e 7.713 em abrigos. A quantidade de moradores de rua aumentou de modo proporcional ao aumento da população, em relação ao levantamento feito em 2009, que apontou 13.666
pessoas.

>>UMA OPORTUNIDADE

No mapeamento feito pela pesquisa, constatou-se que do total de moradores em situação de rua, 26% são mulheres, sendo que 12% vivem nas ruas e 14% entre acolhidos. Neste sentido, a Toca de Assis realiza, há doze anos, um trabalho de resgate dessas mulheres. Busca reinseri-las na sociedade. Conforme a irmã Lívia Maria do Divino Pastor, 36, o trabalho é complexo. O local de ação é na Praça da Sé e no Parque dom Pedro. De acordo com o recenseamento, no centro, é onde se concentra a maior parte dos moradores em situação de rua do município, 53,3%. A Pastoral de rua da Toca de Assis chega pela manhã e fica durante todo o dia. Para ganhar a confiança das moradoras de rua leva alimentos, roupas e palavras do evangelho. Muitas são arredias, desconfiadas. Outras têm problemas psiquiátricos. Algumas querem contar suas histórias de vida e outras nem sabem quem são. A maioria não possui documentos. Nestes casos, as irmãs recorrem ao Ministério Público e muitas vezes conseguem resolver essa parte burocrática.

Vera Lúcia Alves dos Santos é uma ex-moradora de rua que foi resgatada pelas irmãs da Toca de Assis. Por trás dos óculos, um olhar distante. Com um leve sorriso no rosto ela responde às perguntas. Confunde-se no sobrenome, não sabe se é Santos ou Nascimento. Irmã Lívia a ajuda a lembrar-se, assim como a idade. Ela tem 54 anos. Vera também não se lembra por quanto tempo morou nas ruas de São Paulo. Ela diz que saiu de casa em um dia de chuva, ficou andando pela rua e nunca mais voltou. Vera é de Cruzeiro, no Vale do Paraíba. Veio parar na Praça da Sé. Ela tem dois filhos, Reginaldo e Olívia. Há muito perdeu o contato com eles. Vera Lúcia não esquece os dias e noites de chuva pelos quais passou. “Eu dormia na chuva. A chuva caindo e eu dormindo”, lembra.

Na casa, Vera mora com as irmãs e outras seis acolhidas. Mulheres que como ela vivenciaram a desumanidade das ruas e agora experimentam uma nova vida. Lá, cada uma tem uma ocupação. Arrumar a casa, lavar louça, roupas, cozinhar. E quando chega a noite, de banho tomado e corpo alimentado, têm um lugar para dormir. “Infelizmente, não podemos ajudar todas as pessoas, mas a gente tenta fazer o máximo possível”, lamenta irmã Lívia. Vera Lúcia foi contemplada. Está na casa há um ano. “Minha vida melhorou bastante depois que cheguei aqui”, finaliza, sem desfazer o sorriso.

Para irmã Lívia, a sociedade rejeita essas mulheres e a rua as desfigura. “Muitas perdem a identidade. Não se sentem humanas. Não conseguem sentar-se em uma mesa para comer. Infelizmente vivenciamos essa realidade”, relata. A irmã acrescenta que a maioria delas não está na rua porque quer. Muitas estão lá porque sofreram traumas. Porque sofreram violência sexual dentro de casa, pelo pai, por um parente. Porque se envolveram com álcool e drogas. Tem gente que já é parte da rua. Não consegue mais sair daquela situação. Conforme irmã Lívia essas mulheres foram muito maltratadas pela vida e por outras pessoas e, por isso, quando alguém se aproxima com a intenção de  ajudá-las, acreditam que irá maltratá-las também. Irmã Lívia define o trabalho da Toca de Assis: “Não é questão só do físico, mas atenção e ajuda espiritual também. Tentamos dar dignidade e amor a essas mulheres, mostrar que tem alguém que se importa com elas”.

>> NA RUA

Deitada em uma calçada atrás do Pátio do Colégio, sob o sol castigante do meio - dia, Catia Elizabete de Almeida parece alheia ao que acontece ao redor. Prefere ficar ali, gosta do sol, diz que já passou muito frio. Ela tem 51 anos e está na rua há dez. Sobre o motivo que a levou a morar ali, ela não sabe dizer. Já trabalhou em banca e entregando folhetos na rua. “Casa eu nunca tive, moça. Já morei em albergue. Eu já tive família, mas agora não tenho mais”, conta com certa inquietude. Nesse momento Cátia fica incomodada e muda de assunto. Encolhe-se ainda mais contra o muro. Fica nervosa. Não quer mais falar. Argumenta que está com a tireoide atacada, que não está nada bem da cabeça. “Minha cabeça dói, eu não posso falar”, finaliza. A entrevista acaba ali.

Em outro ponto da Praça da Sé, outra Vera Lucia, sem sobrenome. Diz que é só Vera Lúcia mesmo. Ela arruma um carrinho desses de feira. Está cheio de roupas. “Eu ‘tô’ com essa ‘tiboia’”, refere-se à tipoia que trás no braço direito. Segundo ela, há dois anos o quebrou, quando caiu de uma escada e ainda não tinha sarado. Ela conta que teve o cobertor roubado durante a noite. Sobre a idade, com um sorriso, fala que tem 45. Aparenta ter bem mais. Vera Lúcia mostra a perna esquerda,  enorme. Ela está com trombose. Diz que sente muita dor. Vera Lúcia é de Perus, município de São Paulo. Ela se lembra que o ex-marido tentou matá-la e começa a chorar. Pede desculpas por contar seus problemas. “Eu morava nos fundos. Ele aceitou que eu morasse lá, mas quando ele bebe, aí ele vira bicho. Ele também começou a usar pedra”, relata. Ela conta que tem dois filhos. “Minha filha, a Paloma é modelo. Você conhece ela? É, e eu sou avozinha. ‘Tô’ com saudade dos meus netinhos”, desabafa. Na rua, realidade e fantasaia se misturam.  

>>ONG

“Não podemos simplesmente abandonar, fechar os olhos para essa realidade. Se eu tenho duas camisetas, por que uma não pode ser de alguém que precisa?”, indaga Ana Paula Hipólito, 30, consultora de viagens e fundadora da ONG Cobertor do Bem, que realiza um trabalho de doação de roupas e distribuição de sopa, na Praça da Sé, no Minhocão e no Pátio do Colégio. No mês de outubro, a Prefeitura cogitou proibir os sopões e gerou polêmica entre as ONGs que praticam essa ação. Um dos motivos da proibição seria a sujeira, o lixo deixado nas ruas pelos moradores, depois de consumir o alimento. Segundo Ana, além disso, houve, um caso em que um grupo distribuiu comida estragada. Dois moradores de rua morreram por intoxicação. “Nosso trabalho é ilegal, se a polícia pegar vai todo mundo preso”, revela.

Para o produtor de eventos, Wilson Lira, 46, membro da ONG, a sociedade finge não ver o morador de rua, trata-os como lixo que deve ser recolhido de suas calçadas. “Muitas dessas pessoas não se sentem nem gente mais”, conta. Segundo ele, há pessoas que criticam o trabalho da ONG. Quem critica vê esses projetos de distribuição de alimentos e agasalhos como algo negativo. Alega que essas ações os deixam mal-acostumados. Incentivando-os a permanecer sob aquela condição. “Mas se for partir desse princípio ninguém faz nada”, acredita.

Outro membro da ONG, o publicitário Sebastião Costa, 47, diz que o trabalho não é fácil e para realizá-lo as pessoas devem estar engajadas. “Tem que estar com o coração zerado. Não estamos ali para julgá-los, mas para ajuda-los”, afirma, referindo-se ao fato de que não sabem, ao certo, quem são as pessoas as quais prestam auxílio. Se são merecedoras ou não. Se batiam nas esposas, nos filhos. Se maltratavam animais. Sobre o fato de muitos moradores preferirem às ruas aos albergues, os membros da ONG são unânimes. Eles não gostam de ter horários nem de dormir com pessoas desconhecidas. Além do mais, ocorrem roubos de seus pertences. Nas ruas eles se fecham em pequenos grupos e acabam, de certa forma, se protegendo.

No artigo 7º do Decreto Federal citado, a Política Nacional para a População em Situação de Rua objetiva: “assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, moradia, segurança, cultura, esporte, lazer, trabalho e renda”. Tais objetivos, na cidade de São Paulo, por enquanto só vigoram no papel. 

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Perfil - DE REPENTE ALZIRA E


A casa é simples, agradável, inspiradora. No muro, orquídeas de variadas cores chamam a atenção de quem chega. O gato Tapume, simpático, sociável, enorme, faz-se notar de imediato. Assim é a moradia de Alzira Maria Miranda Espíndola, 57, hoje Alzira E, sem o ponto de abreviação, como ela faz questão de frisar, cantora sul-mato-grossense, radicada em São Paulo há quase trinta anos. Alzira Como o sobrenome já denuncia é irmã de Tetê Espíndola, famosa nos anos 80 com “Escrito nas estrelas”, música vencedora do Festival dos Festivais da Rede Globo de 1985. Sétima dentre oito irmãos, dos quais seis são músicos, Alzira sempre buscou sua independência musical. “Não é fácil ser irmã de uma voz tão rara. É difícil ter esse desprendimento”. A cantora revela que não sabia de seu potencial. Nos vocais que fazia para a irmã cantava em soprano. Descobriu mais tarde que era contralto e que podia ir mais além do que imaginava. “Tive que trabalhar meu psicológico para libertar minha voz".

O início

Alzira diz que precisa desfazer um grande equívoco sobre o início de sua carreira. Em 1977, os quatro irmãos Geraldo, Tetê, Celito e Alzira gravaram o disco “Tetê e o Lírio Selvagem”. Mas após o trabalho, a gravadora quis investir apenas na voz de Tetê e dispensou o restante do grupo. “Naquele momento, o sonho caiu por terra. A gente tinha começado na sala de casa, éramos um Beatles”. Lamenta. “A Tetê era a estrela, mas não éramos um grupo qualquer”, conclui. Nesta mesma época, Alzira, então com dezoito anos de idade, engravidou da primeira, dos cincos filhos e voltou para sua terra. “A vida me pegou de outro jeito”, reflete. No grupo, tocava violão de 12 cordas e fazia alguns vocais, mas não tinha autonomia.
Ao contrário do que se conhece por aí, sua vida profissional teve início no ano de 1985, quando lançou o primeiro disco independente, produzido pelo conterrâneo e amigo, Almir Sater. Antes disso, ela não fazia a menor ideia do que estava vivendo. Era levada pelos irmãos mais velhos. Fazia o que lhe mandavam. Estava muito ligada à família. Quando voltou para São Paulo em 85, a irmã já era sucesso nacional. “A Tetê me chamou para tocar com ela, mas eu não quis. Não queria atrapalhar sua carreira. As pessoas não entenderam, acharam que eu estava com inveja”, recorda. Apesar da dor, aquela foi uma decisão crucial para sua vida. Após o impacto inicial diante da negativa, Alzirinha como é chamada pelos irmãos ganhou respeito. “Eu já tinha quatro filhos e estava separada. Precisava do dinheiro. Foi difícil. A Tetê ficou magoada, mas depois ela entendeu”, conta.

Parcerias

Alzira E divide sua trajetória em três fases: a primeira que ela define como algo ligado às raízes, no seio de sua terra, com família e amigos. “Tive o privilégio de estar ligada a três talentos do Mato Grosso do Sul”. Ela se refere aos irmãos Tetê e Geraldo e ao amigo Almir Sater. Alzira fala com orgulho sobre a parceria com o violeiro famoso. O músico fazia parte de sua turma de escola. Ela diz que notou antes de todos o talento do músico galã, coisa que o grande público só viria a conhecer anos mais tarde. “Era algo intuitivo, sincero, nunca busquei as coisas pela oportunidade, sigo o que vejo que é profundo”, afirma.
A segunda fase foi ao lado de Itamar Assumpção, um dos grandes nomes da Vanguarda Paulista, nos anos 70 e 80. Foi após conhecer o músico que ela começou a compor de verdade. “Com ele, veio a poética, o autoral”. A cantora se emociona ao falar do parceiro que morreu no momento em que a internet nascia. “Ele chegou a ter um computador, mas não pegou a era das redes sociais”, entristece-se. Com o músico fez uma turnê pela Alemanha. Ela conta que ficou admirada de ver como Assumpção era querido por lá, diferentemente do que acontecia aqui. “Lá as pessoas ficavam enlouquecidas e aqui ele se apresentava numa salinha minúscula e o cachê era pouco. Às vezes ele nem recebia”, lembra. Em breve, Alzira pretende lançar um trabalho inédito com Itamar Assumpção. Até hoje ela lamenta a perda do amigo e compadre, e só agora, quase dez anos depois, consegue pensar em lançar o trabalho há muito engavetado.
Na fase atual da carreira tem como parceiro, arrudA. Poeta paulistano, filho da poeta Eunice Arruda. A poesia de arrudA é diferente, ousada, minimalista. “Ele nunca havia trabalhado com música e poema puro. É uma poesia sintética que fala uma língua exclusiva. Fala muito em poucas palavras”. As músicas desta pareceria fazem parte do CD mais recente de Alzira, Pedindo a Palavra, produzido pelo baixista Du Moreira e lançado em 2011. “Os poemas pediam um som que os envolvessem”, diz.  

Música e família

Alzira, desde criança, tem um carinho especial pela poesia. Ela já musicou Cora Coralina (Rio Vermelho) e trabalhou com a poetisa Alice Ruiz. As primeiras poesias que teve contato foram escritas por sua mãe, Alba Miranda que, aliás, deixou como legado toda a parte artística que envolve a família Espíndola. Alzira conta com alegria que a mãe tinha um gosto refinado. Artistas como Orlando Silva, Ângela Maria, Dalva de Oliveira, Noel Rosa eram os seus preferidos. Alba também pintava e cantava. Eis uma de suas primeiras e mais felizes lembranças musicais. Os tios trigêmeos que tocavam piano erudito também agregaram valor musical à pequena Alzira e seus irmãos. Havia também os grupos paraguaios, amigos de seu pai, que nos aniversários tocavam as Guarânias tristes sob as janelas do aniversariante. Aos oito anos, conheceu Beatles, aos doze Jimi Hendrix e Janis Joplin e aos quatorze todo o rock dos anos 70. Quem apresentava as novidades eram os amigos dos irmãos mais velhos. Todos iam para a casa dos Espíndola para ouvir o disco do momento. “Todos os amigos se reuniam em casa, essa era a festa”, sorri ao recordar. Neste contexto, Alzira lembra que a primeira música que tocou no violão foi Chove Chuva de Jorge Ben Jor, aos 12 anos.
Há quinze anos, as irmãs Tetê e Alzira juntaram-se para realizar o trabalho Anahí (índia guerreira). Alzira revela que o projeto foi pensado como forma de homenagear a mãe. Clássicos como Chalana, Meu primeiro amor e Galopeira eram algumas das músicas que Alba gostava de cantar. Mas no início houve certa preocupação por parte da mãe. “Ela disse: não vão brigar por causa de trabalho”, lembra. “Mas ela não chegou a ver o trabalho pronto. Ela morreu antes do lançamento”, lamenta e conclui que tudo isso serviu para unir ainda mais ela e a irmã. O projeto é sucesso até hoje e, qualquer música, de acordo com a cantora, pode se tornar Anahí. Em momento de descontração lembra que algumas pessoas pensam que Anahí é uma terceira cantora.

Nova geração, novo nome

Alzira acredita que a nova geração da música brasileira cumpre bem o seu papel. “Sinto que esses jovens talentosos respeitam a história da música brasileira. Trabalham em função de fomentar e resgatar a nossa música, longe do comercial”. Talentos como Ana Eliza Assumpção, Anna Cañas, Márcia Castro, Peri Pani, Dani Black, filho da Tetê, e as filhas Iara Rennó e Luz Marina, chegaram para enriquecer o mercado musical independente.  Para ela, as novas formas de conhecimento, por meio da internet, é o que possibilita essa condição. “A internet para a música é a melhor coisa que existe”, defende. Ela diz que seu público tem aumentado com o advento das redes sociais. “Nunca consegui divulgar direito as minhas obras e nos últimos 10 anos, tenho conseguido maior público e também tem crescido em mim, a vontade de fazer coisas novas para essas pessoas,” declara.
Faz cinco anos que Alzira decidiu trocar o sobrenome Espíndola para E. A cantora conta que esta não é a primeira vez que tenta muda-lo. A primeira tentativa foi no disco AMME, - as iniciais de seu nome e sobrenome-, ainda em parceria com Itamar Assumpção. “O nome não pegou”, diz. Aliás, quando tudo ficou pronto, depois de muito suor, o produto LP saiu do mercado e entrou o CD. O disco não foi distribuído. Mas recentemente, Alzira resgatou o trabalho e lançou o show O que é o que é... AMME, no qual faz uma mescla de antigas e novas músicas.
Uma curiosidade interessante envolve a segunda tentativa de mudança de nome. No lançamento do sétimo CD, ela que nasceu de sete meses e é a sétima filha. Além de Alzira E conter sete letras, sentiu que era o momento certo para investir no novo nome e tentar desvincular-se definitivamente do Espíndola, que sempre lhe trouxe confusão. Ela constantemente era confundida com a irmã e até com os irmãos, ao ponto de, em certa ocasião, apresentarem-na como Celito Espíndola. Embora tenha esse tom cabalístico em torno do número sete, Alzira afirma que não foi intencional.  Aconteceu. “Acho também que esse E é coerente, porque estou sempre acompanhada por alguém especial”, analisa. No acervo pessoal da cantora, momentos de sua trajetória musical, ao lado dos parceiros, dos irmãos, dos filhos e dos amigos famosos como Ney Matogrosso e Zélia Duncam, que inclusive já gravaram músicas de sua autoria.
Alzira diz que nunca trabalhou pensando só em ganhar dinheiro, mas pelo prazer, por amor à arte. “Para mim isso é entrega e para entregar-se é preciso, antes de tudo, acreditar”, enfatiza. Ela não tem aposentadoria nem plano de saúde, mas vive bem. A música sempre a sustentou e guiou sua vida. Com ela criou os cinco filhos. E isso a enche de orgulho. 

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

PARA REDUZIR ACIDENTES, PROJETO PROPÕE COLOCAR MOTOS ATRÁS DE CARROS

Segundo a Prefeitura 800 mil motocicletas circulam diariamente em São Paulo


            De acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), em balanço divulgado no mês setembro, o número de acidentes fatais envolvendo motociclistas, na cidade, retraiu 23%, no primeiro semestre de 2012 em relação ao mesmo período de 2011 que teve 275 mortes contra 211 neste ano. Entre os motivos da retração, segundo o órgão estariam à fiscalização e à proibição da circulação de motos nas pistas expressas da marginal Tietê.

            O presidente da ONG Movimento Brasileiro de Motociclistas (MBM), Luiz Artur Cané questiona a veracidade das informações. “Na verdade eu não acredito que tenha ocorrido uma redução de acidentes com motociclistas, a informação que temos é a de que a média gira em torno 2 a 3 óbitos por dia, sem considerar as mortes ocorridas 76h após o resgate”, afirma.

De acordo com Cané, o problema dos acidentes está além do desrespeito às leis de trânsito. O ativista conta que em reunião com o DETRAN juntamente com a Associação Nacional de Transporte Público (ANTP), a infraestrutura foi uma das principais preocupações colocadas em pauta para constarem no plano do governo. “São avenidas recapeadas com bueiros sem tampas, desníveis, faixas escorregadias, buracos. Além disso, devemos considerar que o motoboy está cumprindo prazos e por isso vai acelerar cada vez mais e tudo isso potencializa os acidentes,” acredita.

 “Já perdi muito serviço, por não ser tão rápido, mas estou vivo. Muitos amigos meus, que trabalhavam comigo estão no cemitério e outros de cadeira de rodas, adiantou correr tanto?” Indaga Eduardo Passos, 31, profissional do moto-frete há quase dez anos. Para ele a culpa por boa parte dos acidentes envolvendo motos é dos empresários, donos de empresas de motoboys, que exigem cada vez mais velocidade nas entregas. Isso acompanhado de um trânsito caótico e falta de infraestrutura, eleva consideravelmente o número de acidentes. 

Para o músico e motociclista Arlen Ribeiro, motos e carros não deveriam circular no mesmo espaço, já que os veículos maiores deformam ruas e avenidas. “Não é possível um veículo que não tem carroceria, (para-choque) conviva com outro que tem, pelo menos, nas vias de maior velocidade, neste caso, deve-se construir moto-faixas”, diz. Cané argumenta que é preciso pensar em políticas de investimento em transportes públicos, já que a cidade não tem espaço para a construção dessas faixas exclusivas.

No que diz respeito ao corredor entre carros, ônibus e caminhões, por onde passam as motocicletas, Cané acredita que o corredor pode ser seguro, desde que se respeite os limites de velocidade. Para ele, não é preciso proibir as motos de circularem nesse espaço, mas regulamentar. Com isso, seria possível reduzir os acidentes.

O Deputado Federal Inocêncio Oliveira (PR/PE) propõe no projeto de lei 3626/2012 “A obrigatoriedade do motociclista circular pelo centro da faixa de trânsito. Proíbe a tomada do "corredor" pelos motociclistas”. Em outras palavras, as motos devem ficar atrás dos carros. De acordo com Ribeiro, a projeto já passou em primeira instância e está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para ser votada. Conforme o motociclista a proposta é equivocada, pois “não há uma conversa com a opinião pública, com quem convive com o problema cotidianamente. Eles simplesmente vão criando as leis e a gente vai aceitando”, critica.

Passos também acredita que caso o projeto seja aprovado, a situação do profissional do trânsito, assim como daquele que precisa de seus serviços, se complicará. “Se isso acontecer São Paulo vai parar, com certeza. Imagina levar um documento urgente no fórum Central, como é que o motoqueiro vai atrás do carro se o juiz está lá aguardando o documento”, opina.

“A intenção é boa, mas é inviável, não há a menor possibilidade deste projeto prosperar, pois ela complica a mobilidade urbana, faltou uma avaliação técnica ”, acredita.  Cané chama atenção para os índices de congestionamento, que segundo números oficiais chega a picos de 200km. O mapeamento, de acordo com o ativista, é feito por meio do monitoramento de apenas 3% das vias. “Agora pensemos em 800 mil motos circulando diariamente pelas ruas e ocupando o espaço de um carro, sem contar a distância de segurança de um veículo para outro. Além disso, os dois veículos tem tempos de frenagem diferentes”, considera.

O ativista aponta a necessidade de campanhas educacionais, que mostrem aos motociclistas os riscos que podem encontrar nas vias. Pois boa parte deles, não tem conhecimento sobre os desníveis, recapeamentos e pedriscos que podem causar acidentes fatais. Além de se apresentar propostas a médio prazo, de investimento em educação. “O motociclista tem que aprender a respeitar a legislação. Tem que exercer a cidadania sob todos os aspectos. A partir do momento em que se conhece os riscos e se respeita a legislação consegue-se melhorar as condições de segurança no trânsito”, assegura. De acordo com a Prefeitura de São Paulo, a morte de motociclistas é o fator que mais preocupa os administradores do trânsito da cidade.





quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

           A mulher tem ocupado importantes espaços na sociedade brasileira. Ela emancipou-se. Deixou de lado a submissão e foi à luta em busca de seus próprios interesses. No entanto, não deixou de ser subjugada. Ela ainda é vítima do preconceito machista, seja no trabalho, pelo chefe e até mesmo dentro de casa, pelo cônjuge ou namorado, o que constitui a violência doméstica. Uma boa parte dos homens não aceita a independência feminina e muitos casos de agressão contra a mulher nascem a partir desta ignorância.
Segundo O Mapa da Violência 2012, elaborado pelo Instituto Sangari, entre 1980 e 2010, ocorreram 92 mil homicídios no Brasil. Deste total foram 43,7 mil mulheres assassinadas, somente na última década. Ainda de acordo com o estudo, há indícios - devido às circunstâncias em que as vítimas foram mortas, como uso de objeto cortante, estrangulamento - de que a maioria ocorre por motivos passionais.
  O medo, a vergonha e a humilhação são barreiras que impossibilitam denúncias por parte das vítimas. Elas escondem o problema, perdoam seus agressores seguidas vezes, sempre que estes se dizem arrependidos. Uma tragédia anunciada. Há, na cultura Ocidental, grandes diferenças na criação de meninos e meninas. Elas são ensinadas a lavar, cozinhar, a cuidar da casa. Eles têm tudo nas mãos. A comida no prato, a roupa lavada, a cama forrada. Tudo feito pelas mães, namoradas e esposas, ao longo de suas vidas.
A consequência desta forma de criação é o pensamento de que as mulheres têm de viver para servir os homens. Em a “Dialética da Solidão”, Octávio Paz diz que o homem vê a mulher como objeto, inclusive ela mesma tem esta imagem de si. “A mulher sempre foi para o homem o ‘outro’, seu contrário e complemento. (...) é um objeto, alternadamente precioso ou nocivo, mas sempre diferente (...) ao submetê-la a todas as deformações que seu interesse, sua vaidade, sua angústia e até mesmo seu amor lhe ditam, o homem transforma-a em instrumento.”
A reflexão que Paz propõe faz sentido. Basta olhar ao redor. O marido ou namorado ciumento que põe a esposa ou namorada sob o seu controle, sua vigilância, como se ela fosse sua propriedade. E quando as coisas não ocorrem como o esperado, ou seja, quando a mulher decide se separar, em diversos casos, o crime é o caminho. Este constitui agressões verbais, psicológicas, espancamentos, homicídio. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), foram registrados, só no mês de Julho deste ano, 4.672 lesões corporais dolosas - quando há intenção de matar – contra mulheres no Estado.
Para as vítimas que sofrem ameaças de seus parceiros há, prevista na Lei Maria da Penha, uma forma jurídica de proteção à mulher. A medida impede o acusado de se aproximar dela ou de seus familiares. Conforme levantamento feito pelo Tribunal de Justiça (TJ), entre janeiro e julho deste ano, a justiça concedeu 1.887 destas medidas protetivas. De acordo com a análise, diariamente 9 mulheres agredidas na capital obtêm proteção. Contudo, a Lei Maria da Penha, embora venha contribuindo para a diminuição da violência, ainda não é suficiente para inibir as ações dos agressores.
A mulher é fisicamente mais vulnerável que o homem, o que a deixa em uma posição de desvantagem frente a este. A situação é parecida em relação à profissão e ao dinheiro e os homens ainda ocupam as melhores posições e os melhores salários no mercado de trabalho. Neste sentido, quando ocorre o contrário torna-se difícil para eles aceitarem uma condição de inferioridade frente a elas, não suportam a ideia de serem comandados pelo sexo oposto.
Mas, mesmo com todos os obstáculos, sociais, morais, econômicos ou sentimentais, a mulher deve manter-se firme na busca por seus direitos e por seu lugar no mundo. Além disso, faz-se necessária e urgente, uma educação menos desigual, para os futuros homens e mulheres deste país com a finalidade de construir uma sociedade mais justa, pautada, sobretudo, no respeito mútuo.