terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Abrem-se as cortinas da realidade inventada, o espetáculo vai começar

Kirk Douglas em cena de "A montanha dos sete abutres"


Manipulação, audiência, gosto pela tragédia, por parte do público: fatos que marcaram a imprensa brasileira nos últimos anos, por fugirem da ética


Não é de hoje e nem por acaso, que o Jornalismo é duramente retratado nas telonas, como algoz da sociedade, o poderoso manipulador das realidades. O Jornalista, como indivíduo social, por sua vez, também não fica atrás, pois muitas vezes, para satisfazer seu ego acaba por agir em prol de status e a ética que deveria ser colocada em prática e em primeiro plano, em cada fato noticiado é deixada de lado. Muitas vezes é como se ela não existisse, para o Jornalista, e principalmente, para as grandes Empresas que o sustenta, aliás, elas são as beneficiadas com a notícia-espetáculo, que gera audiência, visibilidade e lucro. Um exemplo disso é a fantasiosa história do “bebê diabo”, na qual o jornal Notícias Populares, por falta de notícias que chamassem a atenção inventou que havia nascido um bebê com chifres e rabo no ABC paulista. A história se alastrou como praga e as vendas, por conta do caso, alavancaram.
Por outro lado, embora cada profissional tenha uma visão diferente dos fatos, existe uma verdade que é inerente ao acontecimento. Contudo, essa verdade, essa realidade, muitas vezes é vista pelo próprio público como desinteressante, a mídia em conseqüência disso, mostra o que sabe que será aceito, manipulando, muitas vezes, os fatos da maneira que acha necessário.  
A montanha dos sete Abutres filme dos anos 50 mostra a história de um jornalista antiético,  vivido pelo ator Kirk Douglas, que já foi demitido, justamente, por essa postura, de grandes Jornais como o The New York Times, e que vai trabalhar em um pequeno Jornal de uma pequena cidade, onde nada acontece. Ele almeja a qualquer custo voltar ao posto de antes; para isso espetaculariza e adia a solução de um acidente que acaba em tragédia, por conta de sua manipulação.
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Usa-se a máxima “quanto pior, melhor”, e isso, no entanto, acaba banalizando as notícias, sem levar em conta as pessoas envolvidas, os seus sentimentos, as suas dores.
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A apuração e veiculação da verdade deveriam ser a palavras chaves que movem o jornalismo e o jornalista, mas não é. No Brasil temos casos de sensacionalismo vergonhoso, que até hoje vivem latentes na memória da imprensa, como por exemplo, o caso da Escola Base, uma escolinha infantil, cujos donos foram acusados pelos mais variados meios de comunicação de molestarem as crianças. As vítimas acusadas e condenadas pela imprensa tiveram suas vidas transformadas, para o resto de seus dias, devido a esse mau jornalismo; aquele que fere os direitos, a integridade, a honra dos escolhidos para o massacre midiático.  
Não precisamos ir muito longe, há três anos, Isabella Nardoni foi jogada da janela do apartamento onde morava em São Paulo, pelo pai e a madrasta, que foram condenados. As notícias não tinham fim. Os jornais fizeram da tragédia um “show”. Assim como no caso Eloá, a jovem assassinada pelo ex-namorado depois de mantê-la refém em sua casa em Santo André. As pessoas assistiram ao vivo minuto a minuto a   morte anunciada de Eloá.
As tragédias atraem o leitor, o telespectador, e ainda mais quando são mostradas de forma sensacionalista. Usa-se a máxima “quanto pior, melhor”, e isso, no entanto, acaba banalizando as notícias, sem levar em conta as pessoas envolvidas, os seus sentimentos, as suas dores. E quem paga a dignidade roubada de alguém que foi acusado por algo que não cometeu? Ou das mães que perderam suas filhas e sabem que o país inteiro comenta sobre o assunto e que muitos até fazem piadas a respeito, pois o fato de tanto que “girou” foi banalizado?  
Segundo Clóvis Rossi, a função do Jornalista não é somente descrever, mas descrever para transformar. Pouco se vê a esse respeito. Pior, em vez de descrever um fato, a imprensa, o jornalista o modifica, inventa, aumenta, a ética é só uma pequena  palavra. Fecham-se as cortinas, a vida volta ao “normal”, até o próximo espetáculo.


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